E sabe qual é o problema que ele enfrenta? Estão levando a sério demais uma proposta de entretenimento de Shyamalan. Isso mesmo: “Fim dos tempos” é para ser curtido como um bom suspense e ponto. Não quer discutir teorias, mostrar efeitos especiais mirabolantes, nem apresentar nada incrivelmente novo. É diversão para quem se dispuser a entrar na brincadeira. De que outra maneira encarar o pretenso herói (o professor de Ciências) que - ao invés de investigar um fenômeno extraordinário - opta for fugir e, ainda por cima, conversar com as plantas? Justo ele que, em sala de aula, instiga os alunos a buscar respostas para estranhas ocorrências da natureza! E o que dizer de situações patéticas como a da esposa que esconde do marido a “grande traição” de ter tomado uma sobremesa com um colega de trabalho e ainda faz citação à perseguição psicótica da personagem de Glenn Close em “Atração fatal”? É tudo propositalmente bobo, às vezes fora mesmo do contexto de um suspense/terror. Mas vamos à história.
Estrelado por Mark Wahlberg (“Os donos da noite” e “Os infiltrados”), que interpreta o tal professor, o filme está centrado num estranho acontecimento: contaminados por uma toxina que destrói neurotransmissores relacionados ao instinto de sobrevivência, cidadãos norte-americanos passam a protagonizar um suicídio coletivo. Parece absurdo? Há um personagem que ratifica essa impressão ao dizer que achava que já tinha visto de tudo nesse mundo (olha o Shyamalan desbancando a seriedade outra vez). Como não poderia deixar de ser, terrorismo e armas químicas são as primeiras suspeitas. Mas a proporção descomunal com que o ataque é executado leva a outra hipótese. A tal substância venenosa estaria vindo das plantas, em resposta à depredação contínua e crescente do meio ambiente, numa espécie de mecanismo de proteção ao planeta, que elimina quem coloca o equilíbrio dos ecossistemas em risco. É uma premissa curiosa e instigante. E gera cenas incríveis que - se não chegam a causar pânico - provocam grande desconforto e atestam que a criatividade do diretor segue em alta: os corpos caindo do edifício e as mortes no asfalto em "efeito dominó" são dois exemplos emblemáticos. Na verdade, o ponto de partida da história é tão genial que bastam alguns minutos para que o público esteja completamente envolvido.
Bem no início de “Fim dos tempos”, enquanto a série de suicídios está ocorrendo, Elliot discute com seus alunos o desaparecimento da população de abelhas. A dedução de um dos pupilos é curiosa: os cientistas encontrarão uma resposta, mas daí a provar que ela é 100% pertinente já é outra história. Pois é esse caminho que os próximos 80 minutos de projeção irão trilhar. Shyamalan quer seduzir a platéia sem se preocupar em desvendar o mistério. Assim, vão sendo derrubadas todas as possibilidades de entendimento do fenômeno suicida, como aquela de que o ataque se daria somente onde existisse um grande número de pessoas. Destruído esse raciocínio, o suspense aparece até mesmo quando uma criança se diverte no balanço amarrado a um galho de árvore. É inevitável não esperar pelo instante em que a inocente brincadeira poderá despertar a ira da natureza.
Já nos momentos finais, quando parece não existir mais lugar seguro para se proteger, entra em cena uma senhora que vive isolada, morando sozinha, sem energia elétrica ou qualquer indício de comunicação. É nesse derradeiro oásis de proteção que a última certeza sobre a ação da misteriosa toxina será desmantelada, restando ao espectador render-se às seqüências de medo criadas dentro das quatro paredes daquela casa “quase” assombrada. E me parece ser apenas isso o que Shyamalan deseja com seu “Fim dos tempos”: criar tensão e, se possível, garantir alguns sustos, sem maiores comparações com o grande mestre que ele segue homenageando. E por falar nisso, dessa vez, sua participação hitchcockiana é apenas com a voz. Fique atento.