As produções francesas "A culpa é do Fidel" e "Persépolis" têm muito mais em comum do que o idioma falado: ambas têm mulheres na direção e abordam a visão de crianças sobre as transformações políticas que adentram seus lares e deixam de cabeça para baixo tudo o que elas julgavam entender sobre o mundo.
Em "A culpa é do Fidel", a pequena Anna vive em Paris, em 1970, quando é arrancada de sua realidade pequeno-burguesa pelo pesadelo do comunismo. Pelo menos é assim que a babá cubana (que odeia Fidel Castro) explica as mudanças de comportamento dos pais da menina. A verdade é que ela vê sua casa ser "invadida" pela esposa e filha do seu tio espanhol, assassinado pelo ditadura franquista. Esse incidente mexe com os valores do pai de Anna, que viaja ao Chile após a eleição de Salvador Allende, e volta politicamente engajado, abandona o emprego, muda-se com a família para um apartamento menor e proibe que a filha frequente as aulas de catecismo. Todas essas mudanças caem como uma bomba sobre o mundinho de Anna, que passa a fazer coro com a babá contra os barbudos vermelhos.
O encantamento do filme está praticamente nas mãos da pequena estreante Nina Kervel-Bey (guardem esse nome!), que cria uma protagonista adorável, cuja curiosidade, inteligência e petulância são as armas utilizadas para defender as suas verdades. Em tempo: é o segundo trabalho de direção de Julie Gavras, filha do cineasta grego Constantin Costa-Gavras (de "Z", "Amém" e "O corte").
Em "Persépolis", o filme começa com a jovem iraniana Marjane vivendo em Paris e relembrando os acontecimentos políticos que marcaram sua infância e adolescência. Baseada nos quadrinhos da própria diretora, essa animação em preto-e-branco também concentra sua graça na inteligência da pequena e questionadora Marjane, ao tentar entender as transformações que a Revolução Iraniana provocava no seu mundinho, no final da década de 1970, com a queda da ditadura do xá Reza Pahlevi e a ascenção da república do aiatolá Khomeini. É engraçada a cena em que a garotinha diz não saber porque "está todo mundo falando mal do xá", sem entender que não existia liberdade anteriormente para tal manifestação. Mas o sonho de mudanças dura pouco, uma vez que a política do aiatolá exerce um controle também tirano sobre a população iraniana, interferindo na sua maneira de agir e vestir. E é essa dura realidade que leva Marjane ao exílio na França, aos 14 anos.
Apesar do tema forte, a história tem várias situações engraçadas, das brigas infantis às primeiras desilusões amorosas: a cena em que o "príncipe encantado" é pintado como um (quase) ogro é hilária. O filme - que foi indicado ao Oscar de animação - é a estréia em longa-metragem dos diretores e tem Catherine Deneuve e Chiara Mastroianni (mãe e filha na vida real) dublando mãe e filha na ficção. Para quem ainda não sabe o porquê do nome do filme, Persépolis era a capital do Império Persa e, em 1979, foi declarada Patrimônio da Humanidade pela Unesco.
9 comentários:
Nossa, Persepolis eu já queria muito ver, mas agora fiquei super ansioso pra ver A Culpa é do Fidel.
Taí dois filmes qeu são quase impossiveis de serem vistos no cinema, pelo menos fora das grandes metropoles.. é aguardar chegar nas locadoras... ótimas dicas... muitos falam que deveria ser premiado o Persepolis com o Oscar de animação... sou fã de ratatouille mas tbm aidna não vi o Persepolis...
abraços
Daniell,
veja os dois, sim, e me diga depois se eles têm semelhanças ou não. Ah, e obrigado pela visita.
Abração
Rodrigo,
não tiraria o Oscar de "Ratatouille" não, mas "Persépolis" é uma animação bem interessante, toda em preto-e-branco (a não ser pela cor em alguns objetos quando o filme não está em flash-back) e com temas políticos atualíssimos.
Abração
Dois filmes que tenho curiosidade de assistir, especialmente Persépolis. Mas acho que terei que esperar pelos dvds ...
Wallace,
a distribuição desses dois filmes está meio complicada mesmo. Em Goiânia, onde só "Persépolis" chegou, o filme de Marjane só ficou uma semana em cartaz.
Bom vê-lo por aqui.
Abração
a culpa é do Fidel infelizmente não vi e já não está em cartaz em Lisboa, vou ver se o encontro de outra forma, fiquei curioso.
Pesópolis vi há pouco tempo no cinema e gostei demais, muito mais que o rato da cozinha, mas até compreendo o oscar, também não ligo muito às estátuas amerdicanas.
Luis,
"Fidel" parece ser um filme que passou batido para muita gente, mas vale a pena ser visto. Dê um jeito de fazê-lo.
Abração
Assisti "Persépolis" ontem e minha nota é a mesma. Fiquei encantado com essa animação, pois mesmo retratanto algo complicado para o gênero, consegue ser bastante divertida. E não tinha entendido o título do filme mesmo... Abraço!
Vinícius,
achei interessante que o tema pesado tenha sido intercalado com situações engraçadas e bem contextualizadas (infância e adolescência têm daquilo mesmo).
Abração
Postar um comentário