É impressionante a produtividade de Gérard Depardieu. Só para se ter uma idéia do quanto esse ator trabalha, ele está envolvido atualmente, segundo dados do IMDb, em 12 projetos, entre as fases de pré-produção e finalização. Pena que o que chega a estrear nas salas brasileiras seja tão pouco, ficando muitas vezes restrito a blockbusters como “102 dálmatas” (2000) ou comédias (de gosto duvidoso) como “As férias da minha vida” (2006) e “RRRrrr!!! Na idade da pedra” (2004). Ainda assim, nos últimos dois anos, foi possível vê-lo em um dos curtas do ótimo “Paris, te amo” (2006), em que ele também ataca de co-diretor, e no bom “Piaf – Um hino ao amor”, numa ponta como o empresário que descobriu Edith.
“Quando estou amando”, em cartaz no Brasil, é um outro exemplo do belo trabalho desse francês que tem mais de uma centena de filmes no currículo, com trabalhos magníficos como “1900” (Bernardo Bertolucci, 1976), “Meu tio da América” (Alain Resnais, 1980), “Danton - O processo da revolução” (Andrzej Wajda, 1983), “Jean de Florette” (Claude Berri, 1986), “Camille Claudel” (Bruno Nuytten, 1988), “Linda demais para você” (Bertrand Blier, 1989) e “Cyrano de Bergerac” (Jean-Paul Rappeneau, 1990), pelo qual foi indicado ao Oscar de melhor ator. Falar tanto de Depardieu no início dessa matéria se justifica: a sua presença tem tudo a ver com a graça e o encanto que embalam o público nesse novo trabalho. Claro que a beleza e o talento da atriz Cécile De France (“Um lugar na platéia” e “O albergue espanhol”) também ajudam muito.

Estabelece-se entre os dois uma relação cordial, ainda que Alain – um eterno sedutor – esteja a fim de algo mais intenso. Para mantê-la por perto, ele contrata seus serviços como corretora de imóveis, embora fique claro que um novo lar não é uma necessidade real. Na verdade, o coração do músico é a casa que ele quer ver habitada e decorada novamente. O filme não entra em detalhes sobre os motivos do fim do casamento de Marion, mas mostra as dores e as seqüelas que a ruptura deixou. Não demora muito para que o cantor perceba que essa instabilidade emocional da moça, cuja relação com o filho de seis anos tem prioridade sob todas as coisas, é um empecilho praticamente intransponível para a aproximação que ele procura.
A atuação de Depardieu é tão segura, intensa e convincente, que não causa estranheza em momento algum que seu personagem, velho, gordo e decadente, consiga envolver a bela Marion. Não bastasse isso, o ator ainda canta boa parte da trilha sonora que resgata clássicos absolutos da música popular francesa, sucessos de Serge Gainsbourg, Charles Aznavour, Michel Delpech, Jean-Michel Rivat e Christophe, dentre outros. Preste atenção na seqüência em que Bruno pede que Alain cante uma música lenta para dançar com Marion. A mistura de ciúme e dor expressa no olhar do cantor é o exemplo perfeito de como construir um grande personagem e uma cena igualmente memorável: a canção escolhida é uma versão de “Save the last dance for me”, dos norte-americanos Doc Pomus e Mort Shuman. Sem sombra de dúvida, Depardieu encontrou em Alain Moreau e Cécile De France, o papel e a atriz perfeitos para dar vazão ao seu inquestionável e imensurável talento.