agosto 04, 2008

Três filmes e seis pequenas histórias

A infância é o alvo de três produções que deixaram as férias mais divertidas para adultos e crianças. Seja pela ingenuidade ou pela magia das situações retratadas, tanto o brasileiro “Pequenas histórias”, de Helvécio Ratton, como os franceses “O balão vermelho” e “O cavalo branco”, de Albert Lamorisse, encantam todos os públicos, arrancando risadas e suspiros ao iluminar as salas com suas belas histórias.
(Pequenas histórias, 2008 - Helvécio Ratton)
Como o próprio nome indica, “Pequenas histórias” reúne quatro pequenos contos para compor uma colcha de retalhos sobre as lendas e causos brasileiros, costurada por Marieta Severo, subaproveitada como uma narradora que, presa a linhas e bordados, acrescenta pouco à trama. Patrícia Pillar é a sereia da primeira história, que se casa com um pescador, ajudando-o a melhorar de vida (pelo menos enquanto ele cumprir uma promessa feita antes da união). Na sequência, que conta com a participação da ex- Frenéticas Edyr Duqui, temos as desventuras de um coroinha às voltas com as assombrações da Procissão das Almas, numa cidadezinha do interior mineiro. O terceiro segmento traz Paulo José vivendo um Papai Noel que se mete numa encrenca, é procurado pela polícia e encontra num garoto de rua o verdadeiro espírito do Natal. Por fim, o último (e o mais engraçado) episódio tem Gero Camilo vivendo um sujeito cujo nome dispensa apresentações: Zé Burraldo. A cena em que ele participa de uma montagem mambembe de “A Dama das Camélias” é verdadeiramente hilária. Ratton amarra tudo com um humor simples e ingênuo que pode até não arrebatar a criançada (acostumada às pirotecnias das produções atuais), mas com certeza vai conquistar os adultos saudosistas.
(Le ballon rouge, 1956 - Albert Lamorisse)
Aliás, saudosismo está na pauta do dia. Recentemente, a Pandora Filmes relançou dois clássicos do cinema francês dos anos 50, dirigidos por Albert Lamorisse, que estão sendo exibidos numa única sessão com duração de pouco mais de uma hora. O primeiro é “O balão vermelho”, em que um garoto (vivido pelo filho do próprio diretor) encontra um balão bem colorido nas ruas de uma Paris cinzenta para descobrir, logo em seguida, que aquela bola flutuante o seguirá por toda parte, mesmo quando ele não a está segurando, obedecendo, inclusive, suas ordens. Praticamente sem falas, esse média-metragem encanta ao retratar de forma bem lúdica os conflitos e descobertas da infância em relação às normas e condutas do universo adulto, às perdas, ao primeiro sinal de uma paixão... As cenas em que o balão “vinga” seu dono ao perseguir o diretor da escola que o deixou de castigo remetem ao humor chapliniano, em que trejeitos, rodopios, saltos e caretas são as estrelas do riso. A seqüência em que um grupo de garotos persegue nosso protagonista e seu “balão de estimação” com pedras e bodoques pelos becos labirínticos da cidade também é digna de nota. E o desfecho, com uma multicolorida revolta de balões, é inesquecível e encerra em grande estilo a película que ganhou a Palma de Ouro em curta-metragem e o Oscar de roteiro original (até hoje único no formato), batendo “La strada”, obra-prima de Fellini, que acabou levando a estatueta de melhor produção estrangeira.
(Crin blanc: le cheval sauvage, 1953 - Albert Lamorisse)
O outro filme de Lamorisse é “O cavalo branco” e tem como protagonista também um garoto, que se encanta pelo animal do título depois de vê-lo escapar sem se deixar domar pelos poderosos fazendeiros da região. Mais do que desejar a posse do cavalo, o menino (que mora num casebre, às margens de um pântano, com o avô e o irmão menor) quer compartilhar daquela sensação de liberdade, para trilhar seus próprios caminhos, sem laços, fronteiras e cercas que o prendam àquela rotina miserável e sem perspectivas em que vive. Ao capturar imagens dos cavalos em franca disparada ou numa briga pela liderança do bando, o filme ganha nuances de documentário, tendo sido inclusive indicado ao BAFTA nessa categoria. Mas com certeza, é a mistura de poesia e realismo que transforma essa história de amizade, entrega e superação numa aventura emocionante com um final surpreendente e arrebatador. “O cavalo branco” levou ainda o Grande Prêmio de Curta-metragem do Festival de Cannes.

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